A incógnita

O JACC é uma instituição jovem, dedicada à divulgação e promoção do jazz e da música improvisada em geral.
Conheço bem o JACC. Acompanhei-o desde a nascença em 2002 e, no âmbito da minha participação na Coimbra, Capital Nacional da Cultura 2003, fiz o que pude para ajudar o projecto a levantar voo e consolidar a rota. Não fiz mais do que dar uma ajuda modestíssima, não houve mais nada a motivar-me que não fosse a admiração pela coragem e tenacidade desta equipa para levar por diante um projecto que requer tudo isto em doses reforçadas, não sobrou mais nada, passados estes nove anos, que não tenha sido um reforço da minha admiração e uma infinita amizade.
O JACC consolidou e diversificou, ao longo desta sua bem intensa carreira, um percurso sem paralelo no país. Uma percurso recheado de boas iniciativas que revelam uma invejável capacidade de realização, uma assinalável abrangência de acção e um espírito raro de iniciativa no panorama cultural do país. 
O exemplo mais recente desta sua capacidade de iniciativa é o projecto X Jazz – Ciclo de Jazz das Aldeias do Xisto. Trata-se de uma iniciaitiva conjunta do JACC - Jazz ao Centro Clube e da ADXTUR – Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto que visa “criar uma matriz de identificação do espaço com a fruição e criação artística, com natural ênfase para o jazz e músicas com ele relacionadas, aliando-o aos recursos endógenos do território: património, tradição, gastronomia, natureza, paisagem natural e cultural.” 
O programa desta acção iniciou-se em Maio e terminou em 18 de Agosto último com uma residência artística dirigida pelo saxofonista britânico Evan Parker. Tive ocasião de acompanhar a actividade desta residência, que incluiu, para além do trabalho de Evan Parker com os músicos convidados, a exibição do documentário X.TO e vários concertos que foram tendo lugar neste verdadeiro paraíso terreal, que faz esquecer por momentos as troikas e baldroikas em que o país anda metido. 
A utopia é possível. Aconteceu com este X JAZZ. É possível reunir 18 músicos em lugares de sonho, e, literalmente, do nada fazer surgir a música. Também se prova com esta iniciativa a falsidade da ideia de que o público não é sensível a diferentes propostas musicais. A “pimbalhização” da música não passa de uma desculpa para vender produto estragado por fresco. Pode um público musicalmente menos maduro gostar de improvisação livre feita por músicos que praticam um idioma musical complexo? Pode, se lhe derem a oportunidade de a escutar. Neste, como noutros domínios, o que mete medo ao poder é um povo informado.
A utopia é possível. É possível reunir 18 músicos, mais técnicos, produtores, críticos e outros colaboradores, e através da interajuda, do rigor, do espírito de sacrifício e da inspiração produzir algo de novo, orientado apenas e exclusivamente por regras de respeito mútuo, de capacidade de ouvir o outro, de harmonizar os contrários e do exercício do direito à livre expressão musical. 
A utopia é possível. É possível criar um acontecimento de grande arrojo artístico  e associá-lo com enorme sucesso a um projecto de natureza social e económica, com ganhos evidentes para todos, sem “mercados”, sem especulação bolsista, sem notáveis da Fortune 500. Elitário para todos, tal como Vitez disse.
Fica a incógnita desta equação X JAZZ: será que, contra toda a evidência de que é possível, a utopia mesmo assim teima em não vingar?


Nota- Mais fotos deste evento aqui.

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