Acasos felizes que geram ECOS

Uma experiência extraordinariamente positiva é como posso classificar este ECOS (versão Coimbra), que estreou no passado sábado 23, na emblemática Praça do Comércio. É a úlltima obra que escrevi, uma peça para seis percussionistas e seis pistas electrónicas, que funciona a três níveis.

Os músicos e os altifalantes dispõem-se em volta do público, em dois círculos ou elipses (conforme a natureza do espaço) concêntricos. Existe, em primeiro lugar, uma partitura, escrita da primeira à última nota, a ser executada por cada instrumentista, que dispõe para o efeito de um pequeno conjunto de instrumentos de percussão. Os 6 instrumentistas executam as suas partes de forma articulada com as 6 pistas, que contêm o material sonoro de origem electrónica.

A peça é dedicada a R. Murray Schafer, um dos meus grandes inspiradores de há longas décadas. De certa forma, ela evoca — pelo local onde teve lugar e pela própria ideia fundadora — o projecto que levámos a cabo juntos, há 15 anos, o Coimbra Vibra!, que tanto sucesso e repercussão internacional obteve.

Todos os sons executados neste ECOS excitam o espaço circundante. Este responde segundo os seus modos de vibração, segundo a sua assinatura acústica, reproduzindo as suas ressonâncias, colorindo os sons com a sua  reverberação natural e multiplicando esses sons com os ecos que geram. O conjunto destes dois elementos sonoros — sons intrumentais e modos de vibração do espaço — formam um terceiro conjunto sonoro, fruto desta mistura e da combinação imprevisível das diferenças entre as distâncias dos instrumentistas e dos altifalantes, entre si e entre eles e as fachadas dos edifícios que os rodeiam, do momento exacto em que cada som é emitido e de todos os factores que intervêm na propagação do som. Nenhuma execução sucessiva da obra no mesmo local será igual e muito menos, naturalmente, se mudarmos de local. Até no mesmo local a percepção da obra é diferente para quem se situar em pontos diferentes da arena acústica ou circular por ela. Cada execução do ECOS é, de facto e como alguém escreveu, uma experiênciaa única e irrepetível.

Uma experiência que se fica a dever a um conjunto de circunstâncias felizes que não queria deixar de assinalar. Começa na circunstância de o JACC, Jazz ao Centro Clube, através do seu Serviço Educativo, ter acolhido e produzido a ideia. Da sua concepção, um dia em conversa informal, até à sua estreia no passado dia 23, a concretização deste projecto foi o resultado do paciente, inesgotável, atento e multiforme acompanhamento de toda esta operação pela Catarina Pires, a responsável pelo Serviço Educativo do JACC, musa inspiradora desta obra. 
 
Houve outras circunstâncias felizes como o apoio do José Miguel e da sua esforçada equipa e a disponibilidade do Laboratório da Paisagem, de Guimarães, para ceder os sinos do Dies Irea
 
E houve um impulso decisivo, resultante de uma outra circunstância, particularmente feliz, que foi ter podido conhecer os músicos que executaram a obra, os obreiros deste êxito, cuja competência, empenho e dedicação não será jamais possível elogiar condignamente. Falo do Simantra Grupo de Percussão, constituído por Andrés Pérez, Carolina Saldanha, Leandro Teixeira, Luiz Ferreira, Sérgio Bernardo e Ricardo Monteiro. Para eles fica o meu agradecimento, especial e comovido.

Uma palavra final para os amigos de Coimbra e de fora, que se deslocaram à cidade, especialmente para esta estreia.

(as fotos de João Duarte, a quem também agradeço)













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